XVII - A Estrela

Após a destruição da torre e o colapso de todas as suas ilusões, o Louco caminhava lentamente, sentindo o peso das ruínas que deixara para trás. Ele estava cansado, mas também mais leve, como se algo dentro dele tivesse sido purificado pelas chamas e pelo trovão. Tudo o que antes parecia sólido e seguro havia desmoronado, e agora ele se encontrava em um estado de vulnerabilidade, mas também de abertura. Era como se tivesse atravessado uma tempestade violenta e agora estivesse no limiar de algo novo.

Enquanto caminhava, a noite se aproximava, e o céu acima dele começou a se encher de estrelas. Um brilho suave envolveu a paisagem, e o Louco sentiu uma calma inesperada tomar conta de seu ser. Ao longe, ele avistou uma figura à beira de um lago cristalino. Uma mulher, descalça e serena, estava ajoelhada à beira da água. Ela segurava dois cântaros em suas mãos, de onde fluía água incessante. Um cântaro derramava-se no lago, renovando suas águas, enquanto o outro alimentava a terra ao redor, fazendo-a florescer.

A mulher irradiava uma luz suave e tranquilizadora. Ela não parecia pertencer ao mundo ordinário; sua presença era etérea, quase divina. Acima dela, uma estrela brilhava mais intensamente do que todas as outras, como se fosse a fonte de sua luz. O Louco se aproximou devagar, com cuidado para não perturbar a tranquilidade daquele momento.

A Estrela. Ele sabia que era ela. O símbolo de esperança, cura e renovação. Ao vê-la, ele sentiu que sua alma, ainda abalada pela destruição da torre, começava a encontrar consolo. A Estrela parecia lhe trazer uma promessa silenciosa de que, mesmo após o caos, havia beleza, paz e um novo começo.

— Bem-vindo, viajante — disse a Estrela com uma voz suave e melodiosa, sem tirar os olhos de suas tarefas. — Você passou pela destruição, pela queda. Agora, chegou a hora de encontrar a cura.

O Louco se ajoelhou ao lado dela, olhando para a água calma do lago e para a terra que florescia ao seu redor.

— Eu perdi tanto — disse ele em um sussurro. — Tudo que eu acreditava, tudo que eu construí... desmoronou. E agora, não sei mais o que resta.

A Estrela sorriu gentilmente, sua luz envolvendo-o em um manto de serenidade.

— Às vezes, é necessário perder tudo para encontrar o que realmente importa. A destruição pode ser o prelúdio de uma nova criação. E, nas ruínas, a esperança pode renascer.

Ela mergulhou uma mão delicadamente na água, criando pequenos círculos na superfície, e olhou para o Louco.

— O que você vê quando olha para este lago?

O Louco inclinou-se e observou seu reflexo. Por um momento, viu seu próprio rosto, cansado, marcado pelas provações que enfrentara. Mas então, à medida que os círculos se expandiam na água, ele viu algo mais. Um brilho, uma centelha de luz que parecia emergir do fundo de si mesmo. Ele percebeu que, embora tivesse passado por tanto sofrimento e destruição, algo dentro dele permanecia intacto, uma chama de esperança que jamais se apagara.

— Eu vejo... luz — ele disse, surpreso. — Mesmo após tudo, há algo que ainda brilha em mim.

A Estrela assentiu.

— Essa é a sua essência, a centelha divina que nunca pode ser apagada. Mesmo nas noites mais escuras, quando tudo parece perdido, essa luz interior continua a brilhar. E agora é o momento de você se reconectar com ela. A esperança, Louco, não é algo que você encontra fora de si, mas algo que redescobre dentro.

O Louco sentiu lágrimas se formarem em seus olhos, mas elas não eram de tristeza. Eram de alívio, de compreensão. Ele havia sobrevivido à queda, e agora via que o que realmente importava não era o que ele havia perdido, mas o que ele ainda possuía: sua capacidade de recomeçar, de curar, de encontrar beleza mesmo após o caos.

A Estrela continuou a derramar água, como se seu ato fosse uma metáfora viva da renovação constante.

— A água que eu derramo é a cura — explicou ela. — Um cântaro alimenta o lago, renovando as águas que refletem sua verdade. O outro alimenta a terra, permitindo que a vida floresça novamente. Assim é com sua alma. Você deve primeiro olhar para dentro, reconhecer sua luz, para depois permitir que essa luz alimente o mundo ao seu redor.

O Louco fechou os olhos por um momento, sentindo o frescor da água e a suavidade da luz ao seu redor. Ele respirou fundo e, pela primeira vez desde a queda da Torre, sentiu-se verdadeiramente em paz. A Estrela estava certa. Ele havia sobrevivido ao colapso porque algo dentro dele era indestrutível: sua esperança, sua essência. E agora, era o momento de reconstruir, mas não com pressa ou com ansiedade. Ele reconstruiria com calma, com serenidade, sabendo que o que ele carregava dentro de si era mais forte do que qualquer muralha que pudesse erigir no mundo exterior.

Quando abriu os olhos novamente, ele viu a Estrela sorrindo para ele.

— Lembre-se sempre dessa luz, Louco. Mesmo quando o caminho parecer escuro, você sempre poderá encontrá-la se olhar para dentro. E saiba que, assim como as estrelas guiam os navegantes, sua própria luz será sua guia na jornada.

O Louco assentiu, sentindo uma gratidão profunda. Ele sabia que ainda havia muito pela frente, mas agora ele tinha uma nova perspectiva. Ele não precisava temer as quedas, as destruições, ou os desafios. Ele havia encontrado algo eterno, algo que sempre o guiaria, não importa o quão turbulenta fosse a jornada.

Antes de partir, a Estrela lhe ofereceu um último presente. Ela pegou um pouco da água do lago em suas mãos e a derramou gentilmente sobre a cabeça do Louco. A sensação era refrescante, como se estivesse sendo abençoado com uma nova energia, uma nova vida.

— Agora, vá — disse ela. — Sua jornada continua. Mas lembre-se sempre da luz que você carrega. Ela será sua bússola, sua força e seu consolo, não importa o que venha a seguir.

O Louco se levantou, sentindo-se revigorado. A escuridão da noite ainda envolvia o mundo, mas agora ele via o céu cheio de estrelas brilhantes, cada uma um lembrete de que, mesmo na escuridão, a luz sempre existia. Ele sorriu para a Estrela uma última vez, agradecendo silenciosamente por sua sabedoria e cura, e começou a caminhar novamente, com o coração cheio de esperança e a alma mais leve do que nunca.