

X - A Roda da Fortuna
O Louco descia a montanha, seus passos firmes e sua mente em profunda contemplação. O encontro com o Eremita havia plantado uma nova semente em sua alma, a percepção de que o silêncio interior era tão importante quanto as lições aprendidas no mundo exterior. Cada passo o aproximava de algo desconhecido, e ele agora sabia que a incerteza era parte inevitável da jornada.
Quando chegou ao sopé da montanha, o Louco encontrou um caminho diferente daquele que havia trilhado até ali. O terreno tornou-se instável, como se o chão sob seus pés estivesse em constante mudança. A sensação era desconcertante, como se ele não pudesse confiar em nada além de sua própria presença.
De repente, o mundo a sua volta começou a girar.
O Louco sentiu uma estranha vertigem, como se o chão estivesse se movendo em círculos. Ao olhar para o céu, viu nuvens se movendo rapidamente em um redemoinho, girando em espiral. Ele olhou ao redor e percebeu que, no centro de tudo, havia uma imensa roda, suspensa no ar. A roda girava incessantemente, sem nunca parar, como se estivesse presa a um ciclo eterno e imutável.
A Roda da Fortuna.
O Louco se aproximou, fascinado e apreensivo. A roda era adornada com símbolos e figuras enigmáticas. Criaturas com rostos de animais e humanos se revezavam, subindo e descendo enquanto a roda girava. Algumas figuras pareciam exultantes, subindo ao topo, enquanto outras, caindo em direção ao fundo, eram envoltas em tristeza e desespero.
A roda parecia representar o ciclo contínuo de ascensão e queda, uma dança entre o sucesso e o fracasso, o prazer e a dor, o ganho e a perda. Ao olhar para a roda, o Louco percebeu a natureza inconstante da sorte e do destino. Nada permanecia no mesmo lugar por muito tempo. A roda girava para todos, sem distinção.
De repente, uma figura saiu das sombras ao redor da roda. Era uma mulher, sua aparência misteriosa e serena, com um sorriso enigmático no rosto. Ela parecia saber algo que o Louco ainda não compreendia totalmente. A Roda da Fortuna girava ao seu comando, mas sua expressão sugeria que ela não tinha controle absoluto sobre os resultados.
— Bem-vindo, viajante — disse a mulher, sua voz ecoando suavemente no ar. — Está diante da roda que governa o destino de todos. Aqui, o acaso reina. Ninguém escapa dos seus giros.
O Louco, ainda desorientado pela visão da roda, olhou para a mulher.
— O que isso significa? Por que tudo parece tão fora de controle?
Ela sorriu com sabedoria, sem pressa em responder.
— O mundo é movido por ciclos. Sucesso e fracasso, alegria e tristeza, ascensão e queda, todos fazem parte do mesmo movimento. A Roda da Fortuna nunca para de girar. Aqueles que estão no topo logo estarão embaixo, e aqueles que caem, eventualmente, subirão novamente. Tudo está em constante mudança.”
O Louco sentiu um frio na espinha. Ele havia buscado controle em sua jornada, tentando aprender com cada mestre, crescer a cada passo. Mas diante da Roda da Fortuna, ele percebia que, por mais que se preparasse, nem tudo estava sob seu controle.
— Então, estamos todos à mercê da sorte? — perguntou ele, tentando encontrar alguma segurança nas palavras da mulher.
A mulher aproximou-se da roda e a tocou suavemente, fazendo-a girar com mais força.
— A sorte é parte da vida, sim. Há momentos em que nada pode fazer para evitar a queda ou impedir a ascensão. Mas isso não significa que é impotente. O segredo não está em tentar controlar a roda, mas em como reage a seus giros.
— Como assim? — perguntou o Louco, intrigado.
— Aqueles que ficam obcecados pelo controle acabam sendo esmagados pelo ciclo inevitável. Mas aqueles que entendem que a mudança é constante, que a roda nunca para, aprendem a se adaptar. A verdadeira sabedoria não está em tentar resistir ao movimento, mas em aceitar que a vida é feita de altos e baixos. Cada queda é uma preparação para a próxima ascensão, e cada sucesso deve ser tratado com humildade, pois o ciclo sempre se reiniciará.
O Louco ficou em silêncio, refletindo. Ele percebeu que havia tentado controlar seu destino em cada passo de sua jornada, mas a Roda da Fortuna mostrava que isso era uma ilusão. O destino, a sorte, a vida, tudo era uma dança imprevisível.
— E o que devo fazer, então? — perguntou ele, sentindo a ansiedade crescer em seu peito. — Se não posso controlar a roda, como posso seguir em frente sem ser destruído pelas mudanças?
A mulher olhou profundamente nos olhos do Louco, seu sorriso agora mais gentil.
— Aprenda a fluir com o ciclo. Abrace tanto a ascensão quanto a queda. A Roda da Fortuna não é sua inimiga, mas uma parte natural da jornada. Tudo está em movimento, e a estabilidade que procura não está no mundo exterior, mas dentro de si. Se se equilibrar internamente, poderá enfrentar qualquer mudança sem perder o caminho.
O Louco respirou fundo. As palavras da mulher o tranquilizavam de alguma forma. Ele entendeu que a Roda da Fortuna não era uma entidade maligna ou injusta, mas um reflexo da própria natureza da vida. A mudança era inevitável, e sua força viria da forma como ele enfrentava essa mudança.
— Eu aceito — disse o Louco, finalmente. — Não posso controlar o destino, mas posso controlar como reajo a ele.
A mulher assentiu com aprovação.
— Agora você entende. A Roda da Fortuna sempre girará, mas você, como viajante, tem o poder de escolher como seguir em frente, independentemente de onde a roda te colocar.
Ela fez um gesto em direção à roda, e o Louco viu as figuras continuarem seu ciclo de subida e descida. Mas agora ele via algo mais: aquelas figuras não eram vítimas do destino, mas parte de uma dança eterna. Ele também era uma dessas figuras, e sua posição na roda mudaria ao longo do tempo. Mas o verdadeiro poder estava em como ele enfrentaria cada giro.
— Vá, Louco — disse a mulher, com um último sorriso. — A jornada continua. Lembre-se: nada é permanente. Nem a dor, nem o prazer. Abrace a impermanência e encontrará a verdadeira paz.
Com isso, a mulher se afastou, desaparecendo nas sombras que cercavam a Roda da Fortuna. O Louco olhou uma última vez para a roda, agora com uma nova compreensão. Ele não era mais escravo do medo de cair ou do desejo de estar sempre no topo. Ele estava pronto para continuar sua jornada, aceitando que a vida é uma série de ciclos imprevisíveis.
Com essa nova sabedoria, o Louco voltou para sua carruagem. Ele sabia que a estrada à frente estaria cheia de novos desafios e mudanças inesperadas, mas agora ele entendia que a única constante era a mudança, e que sua verdadeira força estava na sua capacidade de aceitar e fluir com esses giros.